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Lula Marques/Folhapress
Em 2007, juiz se recusou a fazer o julgamento pois o autor do processo estava usando chinelos
Um juiz do Paraná que impediu um lavrador de participar de uma
audiência porque usava chinelos terá de pagar R$ 12 mil à União. O valor
se refere a indenização por danos morais que o trabalhador ganhou em
ação contra o governo federal.
O caso que envolveu o juiz Bento
Luiz de Azambuja Moreira e o lavrador Joanir Pereira em Cascavel (PR)
teve repercussão nacional em 2007. À época, Moreira era encarregado de
julgar um processo trabalhista cujo autor era o agricultor, na 3ª Vara
do Trabalho da cidade paranaense.
O
magistrado se recusou a prosseguir com a audiência sob o argumento de
que o uso do calçado "atentaria contra a dignidade do Judiciário".
Em decisão de dezembro de 2016, a Justiça Federal condenou Moreira a
ressarcir a AGU (Advocacia-Geral da União) por reconhecer que o
funcionário público agiu "com culpa grave" e "de forma imprudente" no
caso do lavrador. Joanir recebeu uma indenização de R$ 10 mil da União
em 2013. O valor agora cobrado pela AGU sofreu correção monetária.
"Penso que o réu agiu com culpa grave, de forma imprudente, (...)
porque se trata de um juiz do trabalho que exercia suas funções em
região com grande quantidade de trabalhadores rurais", diz a sentença do
juiz Alexandre Moreira Gauté, da 1ª Vara Federal de Paranaguá (PR).
Segundo o juiz Gauté, a conduta de Moreira "abalou a moral" de Pereira.
"Trabalhador rural, pessoa de poucos recursos financeiros, que não foi à
audiência usando sapatos porque sequer tinha esse tipo de calçado, não
porque quisesse ofender a dignidade do Poder Judiciário".
Na
sentença em favor da União, o juiz que julgou o caso destaca não ter
encontrado documento que pudesse inocentar a atitude do colega
magistrado. "Nem mesmo as portarias e atas apresentadas aqui pelo réu
têm o condão de afastar a culpa de sua conduta." O magistrado afirma que
os documentos apenas condenavam o uso de bermudas e regatas no ambiente
jurídico.
"Era natural (previsível) que o sr. Joanir viesse a
se sentir moralmente ofendido, como acabou ocorrendo, quando soubesse
[por seu advogado] que a audiência não foi realizada porque ele estava
calçando chinelos, a despeito de estar vestido com calça comprida e
camisa social", diz o juiz em trecho da sentença.
A respeito da
vitória na ação contra o juiz, a AGU afirmou, por meio de nota, que a
decisão lembra que juízes estão sujeitos a responsabilização por atos
administrativos que causem danos a terceiros.
O juiz Bento Luiz de Azambuja Moreira ainda não foi localizado para comentar a decisão. A reportagem do
UOL solicitou
por e-mail, às 9h13, e por telefone, às 9h42, o contato do magistrado
ao Tribunal Regional do Trabalho do Paraná, por meio de sua assessoria
de comunicação. Até o momento de publicação deste texto, não houve
retorno. Assim que o Tribunal se pronunciar, o texto será atualizado com
as informações fornecidas.